terça-feira, janeiro 20, 2009

Perguntas?

Li um livro do psiquiatra e psicoterapeuta Jorge Bucay e fiquei fascinado com as suas alegorias, os seus contos que após serem contados, ficamos a perceber de imediato a verdadeira realidade.

Deixo aqui algumas das perguntas que o paciente faz ao Jorge.

Dificil, não?
Quase impossivel?
Ou talvez...francamente impossível?
Como se vive sendo diferente?
Que sentido tem viver atormentado?
Pode-se viver de outra maneira sendo lúcido ou, pelo menos, tendo a mente clara?
Se não fosse assim, para que trabalho eu nas minhas questões?
Para que faço terapia?
Qual é a função de um terapeuta? Desadaptar as pessoas que supostamente o procuram por estarem a sofrer?
E que faço eu nesta procura?
Então, o que faço é trocar um sofrimento por outro, que nem sequer me dá o consolo de ser partilhado por quase toda a gente?
Que é a psicoterapia? Uma enorme fábrica de frustrações para "gente especial"?
Uma espécie de seita de sádicos, inventores de sofisticados métodos de tortura refinados e exclusivos?
Será verdade que, melhor que viver na ignorância de um universo inventado, é sofrer intensamente a realidade?
Para que se pode utilizar a consciência plena da solidão e o compromisso existencial para consigo mesmo?
Que vantagem, por favor, que vantagem tem habituar-se a não esperar nada de ninguém?
Se o mundo tangível é uma porcaria, se as pessoas reais são uma merda, se as situações autênticas das nossas vidas são uma complicação, será saudável enterrar-se em trampa e passear por entre os dejectos da humanidade?
Não terão razão as religiões que oferecem consolo ali para o que não se consegue obter aqui?
Não terão também razão, quando depositam o trabalho todo num Deus todo-poderoso que se encarregará de nós, se nos portarmos bem?
Não será muito mais fácil portar-me bem do que ser eu mesmo?
Não será, porventura, muito mais fácil e simples aceitar o conceito de bem e de mal que todos aceitam como correcto?
Ou, pelo menos, não será melhor fazer como toda a gente, que age como se estivesse de acordo com ele?
Não terão razão os bruxos, magos, curandeiros e feiticieiros, quando querem sarar-nos com a magia da nossa fé?
Não terão razão aqueles que apostam na capacidade ilimitada de exercer o controlo com a nossa mente sobre todos os factos ou situações externas?
Não será verdade que, na realidade, não existe nada fora de mim e que a minha vida é apenas um pequeno pesadelo de coisas, pessoas e factos inventados pela minha criativa imaginação?
Quem pode crer que isto que acontece é a única possibilidade?
Que obrigação tem outra pessoa de me entender?
Que obrigação tem de me aceitar?
Que obrigação tem de me escutar?
Que obrigação tem de me aprovar?
Que obrigação tem de não me mentir?
Que obrigação tem de pensar em mim?
Que obrigação tem de gostar de mim como eu gostaria?
Que obrigação tem de gostar de mim na medida em que eu gostaria?
Que obrigação tem qualquer outra pessoa de gostar de mim?
Que obrigação tem de me respeitar?
Que obrigação tem, o outro, de se aperceber de que eu existo?
E se ninguém se aperceber de que eu existo, para que existo eu?
E se a minha existência não tem sentido sem o outro, como não sacrificar qualquer coisa, sim, QUALQUER COISA, para que o sentido permaneça ao meu alcance?

...E se o caminho desde o parto até ao caixão é solitário, para quê enganarmos-nos, fingindo que podemos encontrar companhia?

Jorge Bucay
Deixa-me que te conte
Ed. Pergaminho, 2004

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